15 - GENÉSIO DE FREITAS, OUTRO DA VELHA GUARDA

 

                 “Faleceu nesta cidade, dia 04 de julho de 1970, aos 87 anos de idade, o senhor Genésio de Freitas, funcionário municipal aposentado”

                 Esta,  seria a notícia lacônica e de rotina, nos acontecimentos diários de Botucatu. Entretanto, o morto pelo que foi e pelo que fez – um da velha guarda botucatuense – merece um registro especial. Trata-se de um cidadão que, dentro das suas possibilidades, bem serviu Botucatu, principalmente o antigo distrito de Espírito Santo do Rio Pardo, hoje município de Pardinho. Homem bom, amigo certo nas horas incertas, coração aberto, companheiro cem por cento, na sua longa existência, soube fazer amigos.

                 Filho do casal Francisco e Maria de Freitas, gente de Itapetininga, desde mocinho radicou-se no Pardinho. Era Comerciante. Mas quem tocava mesmo a casa comercial era a popular Marica Freitas. No balcão, a auxiliá-la estava o neto Adauto Passos, filho de Ernesto Passos, meio-irmão de Genésio.

                 O Tenente Genésio de Freitas ( Oficial da Guarda Nacional ) era tudo na Capela. Naqueles recuados tempos de 1880 em diante, o Major Antonio Pinto Nunes ( Farmacêutico ) o Coronel Amélio de Campos Melo ( Chefe Político ), João Braz Salomé, Capitão Trindade, Euzébio Rocha Camargo, Olivério Moraes Barros, Zico Barreiros, os França, Nenén Bethlém Moreira ( Escrivão de Paz ), formavam ao lado de uma italianada boa, onde se notavam os Dromani, Vicentini, Zanetti, Mário Camiletti, Pauletti, Ceranto, Corulli, Bataglia e outros. Isto sem esquecer o velho Fusco, falecido há poucos meses com noventa e seis anos de idade. O tenente Genésio, integrava o grupo de moços – Tonico de Melo, João Barbeiro, Zéca Leite, Quincas da Farmácia, Cícero Pinto, Euzébio Vicentini, Ortílio Gomes – que movimentavam a pracinha.

                 Político, era membro do Diretório do PRP. Foi Juiz de Paz e Delegado de Polícia. Autoridade enérgica, que não temia caretas. Certa vez, num conflito sangrento, deu voz de prisão a um soldado co-responsável pela briga. O milico, indisciplinado e truculento desacatou o Delegado e ameaçou-o de morte. Genésio, homem de coragem, não teve dúvidas. Reagiu à bala. E mandou o soldado para o hospital.

                  Genésio, espírito esportivo, jogava futebol, promovia carreiras de cavalos, tocava na banda de música, chorando gostoso no bombardino.

                Correm os anos. Genésio transfere residência para o Distrito de Ribeirão Grande. Comerciando durante alguns anos, amealha regular fortuna. Muda-se então para Botucatu, com a sua veneranda mãe. Com a saída do Genésio, o Ribeirão Grande foi decaindo, decaindo, até que se acabou. Desapareceu. Caso único que vi em minha vida: uma vila desaparecer. Nem casas, nem igreja, nem cartório, nem cemitério, nem nada. Na antiga vila, uma tiguera recobre o que fora antes florescente povoação.

                 Em Botucatu Genésio comprou a casa comercial de Décimo Cassetari, lá na Vila dos Lavradores, na rua Vitor Atti. Solteirão impenitente, espírito boêmio, chateou-se nos negócios. Não se abalou. Fechou a casa comercial. Pagou os credores. E foi ser funcionário municipal. A pobreza não lhe fez mossa. Continuou sempre bom, alegre, divertido e serviçal.

                 E chegou à velhice. Com ela os achaques e as doenças. Um dia,  acidentado, visitei-o na Misericórdia Botucatuense. Conversamos longamente.  E ele muito lúcido comentou as estórias que escrevia sobre o Velho Botucatu. Ao despedir-me, perguntei-lhe se precisava de alguma coisa. E ele respondeu:

               - Muito obrigado. Estou bem. Nada preciso. Os meus sobrinhos são muito bons. O João Passos e os irmãos são como que filhos.

               E sorria olhando o João Passos e o Ronaldo que se aproximavam.

( Correio de Botucatu – 19/07/1970)

 


 
<< voltar