17 - O FANFULLA CLUBE

 

         No ano de 1870, aos vinte e seis de março, na Itália, na Villa Collemandina, Província de Lucca, Região da Toscana, nascia o menino José Antonio Bolognini. Aos dez anos de idade, com seus pais e mais o irmão Olinto, imigrou para o Brasil. São Paulo era a Meca da colônia italiana. E Botucatu um dos seus grandes núcleos.

          Quando eu conheci José Bolognini ( o Jépo ou Major para seus amigos ) já era ele estabelecido com armazém de secos e molhados, no  mesmo prédio onde ainda mora sua família, na Avenida Dom Lúcio N.27, antiga Campo Santo, número 1.

          Bolognini, temperamento alegre, bonachão, era um camaradão  no conceito dos seus inúmeros amigos e fregueses. Na sua casa os velhos italianos jogavam o tre sete, o escopône, a bisca e o patrone e soto. Depois vinho, os raviólis e macarronadas, os cabritos ao espeto, muito bem preparados pela Sgna. Bolognini que era uma  excelente cozinheira. O vinho, sempre bom. Importado diretamente. E os fregueses eram assíduos. Além disso,  com os jogos carteados, lícitos, onde também jogava-se o truco nacional, a casa era um verdadeiro Clube da Colônia Italiana. E o homem prosperava.

          Mas não só jogos de salão eram praticados. Havia o jogo do queijo, de preferência dos elementos da Colônia Italiana. O jogo era na rua, na Avenida. Arranjavam um queijo bem curado, com um palmo de diâmetro mais ou menos. E em torno do “provollone” enrolavam uma cinta ou correia. Lamçavam-no com toda força para ver quem o atirava mais longe. A avenida Campo Santo se enchia de curiosos, em toda a sua extensão, porque os lançamentos eram feitos, uns após os outros, até às vizinhanças do Cemitério. Conta-se que o construtor Angelo Lovatto, certa vez arremessou o queijo com tanta força, que ele foi desbeiçar uns túmulos do Cemitério. Os mais conhecidos praticantes do jogo do queijo ( cujas partidas terminavam em comedorias e bródios ) eram o banqueiro Francisco Botti, Júlio Rafanelli, Júlio Tognozzi, José Bolognini, Dinucci & Pardini, Angelo Lovatto, Alfredo Nardini, Pignelli e os Ferrari.

          Na casa de José Bolognini havia frequência de brasileiros. Ali funcionava o Fanfulla Clube. Curiosa sociedade de gastrônomos e amigos do vinho. Doutores Alcides de Almeida Ferrari, Sebastião Villas Bôas, Orlando Costa Leite, Moisés Carlos dos Santos ( todos advogados ), professores Raymundo Penha Forte Cintra e Batista de Sanctis, o engenheiro Leandro Dupré, o Tabelião José da Rocha Torres, ali se reuniam para os seus frequentes e habituais banquetes. Após as patuscadas, os comensais dizendo-se integrantes de uma Confraria de Santo Ivo, realizavam uma coleta, para adquirir caixões de defunto. Para enterrar indigentes, é bom esclarecer. O Prof. Raymundo Penha Forte Cintra, que aí está vivinho da silva, conta que o Major Bolognini, pela resolução de seus amigos, fazia quatro ou cinco aniversários por ano. E as comemorações, eram obrigatórias, com vinho “chianti” e cabritos magistralmente preparados pela esposa do aniversariante.

          Monsenhor Paschoal Ferrari, vigário da Paróquia desde 1886, formava entre os frequentadores da casa do Bolognini. Este, por vezes era o sacristão ou o coroinha, que auxiliava o padre nas cerimônias religiosas. João Ferrari, irmão do Monsenhor, era um excelente mestre de cerimônia. Ao que parece tinha cursado um seminário na Europa. E, na sua ausência é que o Jépo entrava em ação. Diziam as más línguas, por troça naturalmente, que o Jépo esgotava os “Lacrima Chisti” existentes na sacristia.

          José Bolognini, que tinha prestígio na Colônia Italiana, durante alguns anos exerceu as funções de Vice-Consul da Itália. Foi substituído por um Consul de carreira, o Sr. Olivo Andolfato, que aqui esteve até o inicio da Primeira Grande Guerra, em 1914.

         José Bolognini foi casado com da. Maria Musetti Bolognini. O Jépo teve os seguintes filhos: Pedro, Luiz, João e Antonio, todos falecidos; Professoras Irene e Anita, solteiras, Professora Yolanda, casada com Orestes Tortorella; e Professora Isabel, casada com João Petry, residentes em presidente Prudente. José Bolognini faleceu em 18 de maio de 1943 e sua viúva alguns anos depois. O irmão Olinto faleceu nesta cidade, em avançada idade, não há muito tempo.

          Dos companheiros e contemporâneos de José Bolognini, poucos ainda vivem. Mas os que o conheceram bem, afirmam que ele era um bom amigo, um bom cidadão e um grande admirador do Brasil. Enriquecendo, em 1926 fez uma viagem à Europa, para estudar o ambiente e ver se retornava de vez à pátria LONTANA. Não se acostumou. E voltou definitivamente para o Brasil.

          Um cunhado de José Bolognini era Emilio Musetti. Já falecido. Sapateiro. Sempre trabalhou com o finado Francisco Grecco, tio do José Nicoletti, e que foi casado com Dona Pierina Cani, ainda viva, octogenária. Emílio Musetti era solteirão. Sabia tudo o que se passava em Botucatu. Por exemplo, de manhã cedo, contava aos amigos quais das crianças que haviam nascido naquela noite, isto depois de um bate-papo com Nhá Leandra, Corinha, Antonia Gorda e outras comadres da época. Era por isso conhecido como Emílio Parteira.

(Correio de Botucatu,  26/07/1970)

 


 
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